Navegadores

Existem pessoas que nascem, crescem e vivem até o fim de suas vidas em um mesmo lugar, em uma mesma casa. Ano após ano são testemunhas das mudanças daquele lugar, das pessoas que chegam e saem e tal como as árvores daquela região, firmam raízes ali. Conheço pessoas assim, algumas após casarem continuaram na mesma rua, no mesmo bairro, inclusive.

Eu não sou uma dessas pessoas, nunca fui.

Minha primeira mudança acho que aconteceu aos 6 meses, quando meus pais deixaram Belo Horizonte (sim eu sou mineiro, uai!), para ir para São Paulo... acho que vale dizer, que minha família tão pouco era de Minas, eu pai estava lá trabalhando quando eu "cheguei", os anos seguintes trouxeram novas cidades, as vezes em um espaço maior de tempo, as vezes, não. Assim, eu não tem um "melhor amigo" desde o tempo do colégio, não tem aquela vizinha, já uma senhorinha, que a gente viu envelhecer e sequer me lembro se algum dia eu toquei campainha na casa de alguém e sai correndo. Há dias que penso nos "impactos" que isso teve na minha vida, se por um lado me levou a ser "adaptável", e talvez tolerante, a qualquer situação. Por outro pode ter contribuído para que fosse um pouco mais introspectivo, um pouco mais "velho" antes da hora. Quem já mudou de cidade, de escola, sabe o quão delicado são esses momentos. 

Não reclamo disso, mas tenho curiosidade de saber "quem eu seria" caso tivesse sido nascido e criado em um só local. Tanto não tenho problemas, que eu mesmo, com as minhas perninhas, não parei com as andanças após adulto... e por minha conta e risco já tenho lá minhas próprias mudanças. E nesses dias que me preparo para começar um novo movimento, que provavelmente vai me levar a uma grande mudança novamente, não consigo deixar de revisitar essas questões.  

Muitos dias me pego imaginando que não estou longe daquelas pessoas que partiram um dia em caravelas mundo a fora, aliás, chegar ou partir, seja de um aeroporto ou uma rodoviária, quase sempre me lembra desses navegadores. Alguns sortudos tem pessoas esperando, outros pessoas para se despedindo e tem aqueles que apenas observam... De qualquer, todos vão lançar-se ao mar, sem a certeza de voltar, de chegar e muitas vezes sem saber o que os espera...

Talvez meu espírito seja esse... o de um Navegador! 


"Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal"!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu
(FERNANDO PESSOA, 1934)


Enfim... pensamentos soltos, e por falar em pensamento... me lembrei dessa música.



Hasta breve!!

11 comentários:

Eduardo de Souza Caxa disse...

Enquanto teu barquinho estiver ancorado por aqui você terá amigos te esperando.

Unknown disse...

Sou o seu oposto. Nasci, cresci, sempre estive por aqui. Tá certo, durante um bom tempo eu tive as minhas (muitas) partidas e chegadas. Adorava isso! Adoro! Mas, (não tem jeito... canceriano, rs) adoro poder voltar pro ninho. Pena que minha temporada de ir e vir tenha se encerrado!

Boa sorte, porque você só precisa de sorte. O resto você tem de sobra...

Anônimo disse...

Nossa, gostei muito do texto ... algo para pensar mesmo. Bom, eu cresci em um mesmo lugar, depois fui morar com amigos, durante dois anos e depois voltei para a casa dos meus pais, regressão? Sim, talvez ... mas enquanto estive fora, foi uma experiência única, nunca morei sozinho, mas estou pensando seriamente nisso.

Wildeman disse...

tá rodada essa Lata... rs

Paulo Roberto Figueiredo Braccini - Bratz disse...

Gostaria de ter tido uma vida assim ... sou desta natureza mas assim não foi. Viajei muito a trabalho e a passeio, hoje viajo muito a passeio, mas sempre volto para o meu canto aqui em BH. Sucesso em seus navegadores meu caro, e q as bençãos da natureza te acompanhem ...

Beijão

Uma Cara Comum disse...

A gente reconhece mesmo em seus textos essa "alma cigana", que parece se identificar com os "tugas" pq sabe o que é "navegar por aí" (ou pode ser pq tem uma palavra bem clara para definir o que chamamos de "saudades")...

Gustavo disse...

Eu sempre senti dentro de mim que fui feito para o mundo. Dificilmente me identifico com o lugar que estou morando. Depois que sai da casa dos meus pais e voltei, já sinto pulsar o desejo por um novo destino.
Acho que minha alma é cigana ou guarani.

Três Egos disse...

Não tive muitas mudanças quanto você. Até a faculdade nunca mudei de cidade, mas depois que mudei acho que gostei da ideia. A verdade é que acho que não tem nada que me prende em um lugar ou outro, então, tenho diversas possibilidades. Rs. abraço!

Mark disse...

Eu morei sempre em Lisboa... Bom, morei uns meses no Porto (segunda maior cidade portuguesa), mas era muito pequeno (bebé mesmo). Mudar ajuda-nos a crescer, a ganhar maturidade, espírito de responsabilidade. Bem que eu preciso disso.

um abraço grande!

Madi Muller disse...

Esse post, no dia em q estou embarcando pra Portugal, me fez sorrir!
Quanto a ti, sempre te imaginei um cidadão do mundo, peregrino de muitas aventuras, algumas ainda por vir...

Fabrício disse...

me fez lembrar de uma vez que vi uma reportagem sobre um estudo em que era positivo para o desenvolvimento do ser humano essa experiencia de mudar de cidade mais de uma vez. Eu tive essa experiencia e serviu apenas para amadurecer mais cedo e dar um senso critico mto maior sobre qualidade de vida. Eu ja acho que facilita bastante para conhecer novas pessoas, mas amizades mesmo não tanto.

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